Literatura

Compromisso não marcado
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Compromisso não marcado

Alexandre Lucas* Domingo. Suco de limão acrescido de café. Alguns livros e uma dose de frio. O sorriso tinha o tamanho do horizonte e a conversa costurava histórias cheias de retalhos. O dia seguinte era imprevisível. Fazia um relógio de pétalas de flores brancas, o tempo era um lençol suave e as línguas se faziam ponteiros de Tai Chi Chuan.   As mãos amaciaram sorrisos. A cidade estava coberta de arrepios, um convite para abraços temperados de amanhã. O sofá tinha o tamanho da cumplicidade e a música ventilava brilhos. Algumas fotos para revisitar lembranças. Terremotos tão suaves que exerciam imagens de tango. A noite se fez um bloco de anotação, onde as estrelas bordavam neves e a sereia prometia voltar. No dia seguinte, férias. Viagem agendada. As malas estavam leves, ...
Metal brilhante
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Metal brilhante

Francisco Joherbete* Estava a me acomodarEm um estofado sagazQuando olhei para frenteMe deparei com botijão de gás. Um botijão vazioFeito de metalUm metal brilhanteQue me fez passar mal. Quando o viPensei de repenteComo pode o metal como aqueleSer tão aderenteChamar a belezaDe uma forma inocente. Ao comparar-se comigoObservei algo peculiarNós dois temos um brilhoVivo no olharUm brilho não comumE que está muito longe de se acabar. Sobre o autor: Francisco Joherbete *Aluno do 8° ano do Colégio Municipal Pedro Felício Cavalcanti. Gosta de ler poesias e de fazer também. "Abrace sua tristeza".
FRIA
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FRIA

Aqui ao ladoPingoChuvaGotaA água se faz calmariaO nublado do céuÉ a vista para um calmo dia Cômodos representamUma caminhada intensaA casa vaziaMas teu cheiroTeu cheiro ilumina IluminaPercorre a casaA saudade é fria A frieza do espaçoPassa por todo lugarA frieza do passoMe faz te lembrarTudo era friezaMenos o teu corpoAo nos encontrar PassoPassoPassoO caminho da distânciaDo aconchego do abraço Aqui ao ladoPingoChuvaGotaApenas um domingo nublado -ANA RUTY PAZ
Os abismos
Literatura

Os abismos

Ludimilla Barreira* Não sei quando as fendas se pronunciam e formam os grandes abismos, mas há um momento em que algo se rompe de tal forma que os espaços abertos não permitem que possamos nos reconectar. Podemos construir pontes, mas estas nunca serão tão estáveis e seguras quanto a solidez da terra firme. Conexões físicas nos aproximam, mas não nos dão a certeza do preenchimento, nem da troca constante que é responsável por fornecer energia suficiente para nos manter confluindo.  Quando me refiro às profundezas criadas pelas fendas, não quero mencionar apenas aquelas que surgem além das nossas margens, mas também as que dilatam dentro de nós. Por exemplo: quantos abismos deixei surgir entre a pessoa que me tornei e aquela que um dia almejei ser? Ou, até mesmo, quantas outra...
De quem é o governo nas “cidades democráticas”?
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De quem é o governo nas “cidades democráticas”?

Alexandre Lucas No capitalismo, cidades democráticas é uma contradição sistêmica, mas ao mesmo tempo, a tentativa de criar mecanismos de controle e participação social, e ampliar a acessibilidade dos serviços e a própria cidade na sua dimensão mais ampla podem contribuir para alicerçar e acumular forças para construção de um novo modelo de sociabilidade econômica e social, em que o conjunto da sociedade possa decidir e ter direito à cidade.    O conceito de cidades democráticas se alinha a projetos coletivos dentro das estruturas organizativas de disputa pelo poder político para gestar as cidades, esses projetos coletivos, em tese, estariam vinculados ao norte político dos partidos políticos e os movimentos sociais, é o que pressupõe as suas existências. Entretanto,...
O que você fez?
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O que você fez?

Luciana Bessa Todos os anos, escuto a Simone me perguntar: “Então é Natal e o que você fez?”. O Natal passou, mas o cansaço, ainda não. Além de trabalhar oito horas por dia (em alguns momentos bem mais), comprar brigas que não eram minhas, cuidar de quem não deveria, me envolver em situações que não me diziam respeito, perder a paciência, porque as coisas não saíram como havia planejado, eu refleti sobre o meu lugar no mundo.  Na condição de mulher, de trabalhadora, de filha, de tia, de amiga, de leitora fico me questionando o que tenho feito. Não se é o suficiente, já que há muitos anos aboli a fita métrica da minha vida. Mas se realmente preciso fazer algo. Existem momentos, como o típico mês de dezembro, que tais perguntas afloram dentro de mim. Desde os quinze anos, eu tr...
Coletivo Camaradas é dor que tempera esperança
Literatura

Coletivo Camaradas é dor que tempera esperança

Alexandre Lucas* O Coletivo Camaradas é uma organização que tem lado e formulação política no campo teórico, quem tem construído engenharias sociais, em especial na articulação de rede na área cultural e na luta pelo direito à cidade. Ponto de Cultura que se identifica como organização de esquerda, de viés marxista, que teve início em 2007, tem ao longo dos anos criado pontes de diálogos e de escutas com o poder público, universidades, escolas e os movimentos sociais. Tem pautado um diálogo horizontalizado e distante da orquestra das lagartixas.  O poder público que carrega marcas históricas de colonialismo e tingimentos coronelistas, ainda tem dificuldades de compreender o significado da república e da democracia. Nem todos dizem amém e rezam na mesma cartilha, isso que parece ...
O enigma de um crime delicado
Literatura

O enigma de um crime delicado

Luciana Bessa* Conheci a obra Um Crime Delicado (1997), do escritor Sérgio Sant’Anna ao cursar a disciplina de Estudo da Narrativa ministrado pelo prof.  Teoberto Landim. Aleatoriamente cada estudante elegeu um livro para analisar as características desse fenômeno. Prêmio Jabuti em 1998 de melhor romance, eis uma história de amor embebida no erotismo, na comunhão de diferentes artes, com toques de mistério em que o leitor é convidado a descobrir o segredo não da esfinge, mas de uma musa (Inês). A obra Um Crime Delicado (1997) está dividida em três partes. Em nenhuma delas há um subtítulo. Somente os números um, dois e três. A primeira parte é a mais extensa (1- 84), segunda (87-113) e a última (117-132) páginas. Observa-se que o livro não apresenta micronarrativas. A narrativa é...
Se apenas existisse você
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Se apenas existisse você

Alexandre Lucas * As borboletas enfeitam os olhos, mas não são enfeites. Simetria, composição de cores, delicadeza e quase sem peso. Borboletas não são para abraços, imagina para estômagos. As primaveras são bonitas, têm mais flores e borboletas. Flores e borboletas são para encontros passageiros. Talvez sejamos passageiros de algum momento, mas se o tempo não para, estamos sempre passando. Passar, às vezes é tão fácil, como se desfazer de teias de aranha, mas a história não mostra apenas os fios frágeis das aranhas, nem a vida curta das flores e borboletas. As marcas do tempo são tatuagens recontadas por lobos e cordeiros. As flores e borboletas algumas vezes desaparecem nessas histórias, em outras ganham força de rochas duras pelo tamanho da sua suavidade. As rochas duram...
Vinho
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Vinho

Shirley Pinheiro* O primeiro gole escorre pela minha garganta com a promessa de aquecer meu colo. De dentro pra fora, o sangue decora minha pele. O segundo gole é para acostumar o paladar. Um leve formigamento nos ombros denuncia minha falta de costume. O terceiro gole é pelo prazer. A língua saboreando cada mísero contato com o álcool, pelo simples desejo de prolongá-lo. O quarto gole ainda é poesia, enganchada no sorriso que se atreve, em detrimento dos olhos tristes. Os próximos são disfarces. Minhas veias sangrando pelo desejo de embriagar-se. Um esconderijo ineficaz para o que não é dito. Uma porta escancarada para as lágrimas que se aprisionam. Se houvesse justiça, tua embriaguez também seria por tristeza. E cada gole também carregaria uma prece. Ah, look at all the lonely p...