Literatura

O resultado não me define
Literatura

O resultado não me define

Alexandre Lucas* Três de abril de dois e vinte e quatro. Tarde de calor. Encontre-me mais uma vez com ela como faço semanalmente, todas às quartas-feiras. Não tomamos nenhum café, nadinha. Sento no sofá, normalmente com a mão na cabeça como se fizesse um auto cafuné, enquanto isso vou fuxicando da minha vida. Nesta quarta-feira, estava na expectativa da resposta dela, era previsível, mesmo assim, precisava escutar suas palavras, sua afirmação. A resposta veio. Solto um leve sorriso, de como quem diz eu já sabia. Ela me perguntou como estava me sentindo, de imediato, digo: "Estou feliz" e completo com um choro engasgado. Vou tentando debulhar o que o choro não era capaz de dizer. Ela me escutava mexendo os lábios com os dedos, possivelmente nem tenha percebido. Já não consigo me con...
Abril, muito há o que celebrar
Literatura

Abril, muito há o que celebrar

Luciana Bessa* Quarto mês do ano, Abril traz em si muitos momentos celebrativos. Já iniciamos com o Dia da Mentira, no primeiro instante do mês. Em Minas Gerais, circulou um periódico de vida efêmera chamado “A Mentira”, lançado no dia primeiro de abril de 1828, noticiando o falecimento de Dom Pedro, fato que foi desmentido no dia seguinte.  “A Mentira” deixou de circular no dia 14 de setembro de 1949, sem antes noticiar aos credores brasileiros, que no dia 01 de abril de 1850, eles poderiam negociar suas dívidas, sem explicar como e dando como referência um lugar inexistente. Já o 13 de abril é para comemorar o Hino Nacional Brasileiro, pois nessa exata data, no ano de 1831, ele foi tocado pela primeira vez, no Teatro São Pedro de Alcântara, na então capital do Império. Mais...
Ensaio revoluções
Literatura

Ensaio revoluções

Alexandre Lucas* Por favor, que os amores tranquilos mantenham distância. Quero é o fogo! O corpo em brasa, as borboletas em chamas e a poesia ardendo de felicidade. Basta de amores tranquilos! Que o amor solte faíscas pelo celular, fale sacanagem no ouvido em plena reunião e que aproveite cada canto para fazer fogueira e suar desejos. Os amores tranquilos são enfadonhos. Gosto mesmo é de me pegar com a caneta na boca lembrando dos olhos afogueados e dos despudores das noites de furacão. Os amores tranquilos não têm cartas de amor. Que venha a palavra atiçando as pernas cruzadas e enchendo a boca de tesão. Que a linguagem seja um corpo-texto, quente e faminto. Os amores tranquilos são pálidos. Bom são as marcas, as mordidas, a passagem da língua, o cabelo desgovernado o corpo v...
Poema e poesia no meio de nós
Literatura

Poema e poesia no meio de nós

Alexandre Lucas* Já não sei por onde começo, pelo poema ou pela poesia. Era madrugada, carregava uma caixa de flores e a lembrança das mãos dançarinas sobre seus olhos. Poema e a poesia se misturam. Nossas línguas acariciam a lua. As estrelas estão rodopiando e o relógio se perdeu para não contar nosso tempo. Trago o teu ventre tremulando na boca como bandeira de fogo. Incendiamos o poema e a poesia para sentir o calor que nos habita. Teus beijos confessavam a permanência do verso e o desejo do amanhã. Teus cabelos espalhados, marcas da tua presença. Em cada lugar se fez poema e poesia. Colocamos no meio do caminho o sagrado e o profano e nos entranhamos. Bebemos com sede e comemos o poema e a poesia, enquanto devoramos, eles cresciam. A madrugada foi pequena porque poema e poe...
A cidade não cabe debaixo do braço
Literatura

A cidade não cabe debaixo do braço

Alexandre Lucas* A ausência de planejamento, controle e participação social sobre o patrimônio arquitetônico, urbanístico e ambiental, bem como ações para esses setores, é um perigo eminente para infraestrutura, mobilidade urbana, desastres ambientais, memória afetiva e cultural das cidades.   É possível alinhar o passado e o presente e prever cientificamente o futuro das cidades. Conciliar ciência, tecnologia, inovação e participação social, talvez seja um dos caminhos para repensar as cidades, visando constituir urbes mais humanizadas, inteligentes e com redução dos impactos ambientais.   As cidades precisam ser percebidas com uma unidade multifacetada complexa e dividida espacialmente de forma desigual pela ótica da concentração do capital.  O conceito ...
A ignorância é uma dádiva?
Literatura

A ignorância é uma dádiva?

Ludimilla Barreira* Encerramos o mês que foi referenciado pela Organização das Nações Unidas (ONU) para instituir uma data em homenagem às mulheres, o 8 de março, que é comemorado desde o início do século XX, dia este marcado por protestos contra a fome, como na Rússia em 1917, e em momentos anteriores reivindicando a igualdade de gênero e melhores condições de trabalho. Apesar de não ser um dia instituído pelo comércio e não rememorar lembranças ternas, é um dia mantido no calendário nacional como homenagem às mulheres que mesmo diante de tantas adversidades tentam fincar suas pequenas conquistas. Durante todo o mês, percebemos tímidas formas de comemorar o “Dia da Mulher”, seja com palestras tratando de temas centrados na melhoria da vida pessoal/profissional, ou com notícias que ...
Memórias pascais
Literatura

Memórias pascais

Luciana Bessa* Falar sobre a Páscoa é falar sobre uma das mais importantes tradições do Cristianismo. É rememorar a crucificação, morte e ressureição de Jesus Cristo. É justamente a ressureição um dos pilares que move a fé cristã. "Ressuscitou dos mortos ao terceiro dia, conforme as Escrituras". Olhando para trás, me lembro da Semana Santa, pelo menos na minha família, como um momento ritualístico. Na quinta, era preciso limpar toda a casa e lavar os cabelos, já que na sexta-feira não seria permitido, assim como estava terminantemente proibido sair para brincar com os colegas na rua, proferir más palavras e brigar com os irmãos. Todos tinham que se sentar à mesa, embora não fizéssemos isso em outros dias, agradecer pela comida, embora não gostássemos de peixe. A parte boa era comer p...
Pedras, carnes e poesia
Literatura

Pedras, carnes e poesia

Alexandre Lucas* Amanheci com cem sonetos de amor. As palavras desesperadas. O beijo com gosto de agora. Tuas mãos passageiras fazendo trilhas, descobrindo delicadezas e amolecendo a rocha da vida. As águas escorriam entre as rochas. Deslizava água e abraço. O rio se fazia sofá. No caminho pedras, carnes, poesia, pedras, carnes, poesia. Nunca só pedras, nunca só carnes. Poesia, mesmo ferindo a carne e revirando pedras. Bebendo dos teus seios, nutrindo estrelas, o sol era testemunha. O verso se fazia na rocha e o fogo tomava conta da paisagem. A água não apagou o fogo, ele se espalha, no poema e nos vetos. Guardo as chamas para momentos frios e noites ensolaradas. Mil furacões pela manhã, algumas mordidas, leves assopros e um caldeirão de memórias. Respira, quatro pared...
Primeiro degrau
Literatura

Primeiro degrau

Alexandre Lucas* Acordei com a almofada de lado e meus pensamentos circulando em tua boca. A lua iluminava as lembranças da noite que não saiu do primeiro degrau. Portas fechadas.  O desejo transbordando e a resistência costurando os limites.  Naquela noite bebemos um pouco de nós, colocamos as cartas na mesa e tentamos decifrar as linhas que se perdiam na tímida massagem.  Deixei de reparar a lua, estava distante.  Os postes à meia-luz, o silêncio, a rua, a conjugação que nos abarcava. Seguimos de mãos dadas, tentando corresponder os passos. A poesia sussurrava, mas era preciso dar forma ao poema, entender a sua dimensão, o seu ritmo, mas a paixão, o amor e o sexo não cabem no poema. O poema é pequeno diante das noites e dos girassóis, das trovoadas e das ausências. Tem roseira...
Apagamos as luzes
Literatura

Apagamos as luzes

Alexandre Lucas* A borboleta surgiu entre sorrisos decotados. Manhã, vejo estrelas. Bebo o vermelho- arroxeado do suco de beterraba, está tudo vermelho. O alarme toca para o bom dia de girassol.  A promessa se cumpre.  A vida bate palmas para a esperança.  Você pergunta sobre o vinho e a embriaguez estão na conexão dos nossos versos. A borboleta dança entre a palavra e o escondido. O esconderijo dos desejos abre os braços com a timidez dos olhos pronunciados. A tranquilidade borda um lençol de traquinagem para repousar o cansaço ou para validar o embaraço dos corpos.  Escrevo a última carta dos amores impossíveis, mentira! A borboleta voa, aparece quando quer. O vinho já foi comprado, a lua faz rede, nós fazemos disfarces. As cartas estão na mesa, mas não nos ensina...