Literatura

Rebobinando
Literatura

Rebobinando

Ludimilla Barreira* A última textura que senti na minha bochecha e entre os meus dedos foram os grãos de areia na praia, meio áspero, meio frio, não combinava com as minhas lembranças de sol e sal, da brisa que tocava meus braços e se abrigava no meu peito, dos sorrisos trocados e da música animada. Depois que meu rosto encostou na areia fria e úmida as luzes se apagaram. Foi um movimento que parecia automatizado, como esses sorrisos que treinamos na frente do espelho para sair bem nas fotos, levantei a mão e a apontei para a minha cabeça. Eu estava cansada de não encontrar uma fuga ou uma solução para todos esses problemas, busquei alívio para o peso amarrado em mim, essa angústia que mastiga cada parte e não me deixa pensar em uma resposta, apenas nas questões. Aprendi que o ...
“À espera de experiências extraordinárias”
Literatura

“À espera de experiências extraordinárias”

Luciana Bessa* Quando adolescente, eu vivia “à espera de experiências extraordinárias” iguais às que eu lia nos livros: castelos medievais, ilhas desertas, jantares à luz de vela na Torre Eiffel, chuva de flores, amor eterno, pôr do sol na Toscana e até mesmo príncipe encantado. Confesso que, em determinado momento da vida, fazer a distinção entre ficção e realidade, foi algo difícil, já que eu me questionava: por que o que acontece nas páginas dos livros não pode acontecer fora delas? Nessa espera, algumas experiências extraordinárias foram acontecendo sem que eu ao menos me desse conta. A primeira delas foi que sendo filha de uma salgadeira, que trabalhava de sol a sol para sustentar sozinha três filhos, na década de 1990, consegui ingressar no curso de Letras da Universidade Es...
Início ou fim?
Literatura

Início ou fim?

Leila Cardoso de Lima* Aqui estou eu...Sentada de frente para o lugar onde tudo termina... ou começa...É um lugar onde as flores têm as cores mais vibrantes que possam existir, o detalhe de cada pétala as torna única... Porém, elas não possuem a maior essência de uma flor, o cheiro...O canto mais suave que se pode ouvir é o dos pássaros, que voam livremente por saberem que ninguém que está aqui irá lhe fazer mal...Tem centenas de pessoas reunidas no mesmo lugar... Só que eu não as vejo interagindo umas com as outras, elas não sorriem, não conversam...Tem centenas de pessoas aqui e os bancos continuam todos vazios...Já sabe de qual lugar estou falando?- Isso! Você acertou se pensou em um cemitério...Parece fria a forma de descrever um lugar como esse já que vários sonhos terminaram aqui,...
Canções de chegada e despedida
Literatura

Canções de chegada e despedida

Alexandre Lucas* Tocava gemidos. A lua testemunhava o vazio da escuridão. Preenchidos de instantes devorava a fome, a sede e o vácuo. O vácuo, o vácuo. Tenho que parar por aqui. Ponto final. A lua não deixa, avisa todas as noites da sua imensidão e do seu brilho.  Tocava gemidos na parede esquecida, no banco e na cama de pouco espaço. Desenhava com a ponta dos dedos o carinho e a solidão. Nos encontramos, quase que por acaso, quase. Estava quase sóbrio, quase bêbado. Sentia sua língua ansiosa e decidida, era isso que queria, mas já não sabia os caminhos, os meios e a disposição.  Amanhã, talvez, as marcas das tuas mordidas e unhas tenham desaparecido, como as nuvens que estão mudando a cada olhada. Talvez os gemidos sejam outros, outros e outros, ou mesmo sejam dor. Aind...
“Espelho, espelho meu, existe alguém mais bonita do que eu”
Literatura

“Espelho, espelho meu, existe alguém mais bonita do que eu”

Luciana Bessa* A procura pela beleza existe desde a Antiguidade, quando se criavam óleos e banhos aromáticos, quando se obrigavam as mulheres usarem espartilhos sob a desculpa que realçaria sua feminilidade e diminuiria sua cintura, quando as incentivam a terem uma alimentação frugal para serem magras, ou mesmo, quando precisavam usar sapatos pontudos e longos, causando-lhes lesões. Lendo contos de fadas “Branca de Neve e os Sete Anões”, em que uma rainha manda matar sua enteada, porque simplesmente ela era dotada de beleza; assistindo a filmes, suas inúmeras versões, refilmagens, adaptações, em que a beleza estava em primeiro lugar e nada mais importava, confesso a vocês: fiquei com medo da beleza.  Talvez, por isso, desde a adolescência, trago comigo uma frase do poeta Mede...
Flora e a lamparina
Literatura

Flora e a lamparina

Tay Oliveira* A luz se apagouA menina logo estranhouQuando ligou os elétricosE nada mais funcionou E agora minha gente?O celular descarregouVamos ficar no escuroJá que a luz se apagou? Sua vó logo correuPegou o gás e o pavioVeio trazendo na mãoAlgo que ela nunca viu Que negócio é esse vovóQue parece um funil?Ficou bem assustadaSua avó logo sorriu Isso aqui é lamparinaNão precisa recarregarBasta só riscar um fósforoPara ela funcionar Flora olhou com estranhezaQuando o fogo dela saiuDeixando a casa iluminadaCoisa interessante nunca viu Era a lamparina nossa luzQuando a noite já raiavaContava sua vóComo aquilo funcionava Flora logo a encaravaE muitas coisas questionavaComo fazia a tarefa de noiteSe não tinha luz, não enxergava? A lamparina, dizia a avóEra o que nos ...
O rio que nos abraça
Literatura

O rio que nos abraça

Alexandre Lucas* O rio assimétrico desenha vaginas no seu percurso. As águas caminham transbordando música. Os pássaros cantam e desaparecem entre as árvores. Mastigo algumas sementes e me cubro de sol e sombra.  Sigo as vaginas do rio. Procuro alguns minutos de silêncio dentro dos barulhos que habitam os meus dias. As águas me atravessam acolhendo os meus passos.  Verde por todos os lados, mas nem tudo é esperança. Nenhuma lasanha por aqui, nem mesmo um simples macarrão. Água na boca.  Talvez tenha que andar mais. Hoje, apenas os desenhos do rio.  A folha desce sendo seu próprio barco nos braços rio.  Molho a cabeça. Escorro entre as pedras e as águas para tentar espatifar os pensamentos petrificados. Sobre o autor: Alexandre Lucas ...
Despeje poesia na carne
Literatura

Despeje poesia na carne

Alexandre Lucas* Poesia com carne, um pouco de vinho. A lucidez é uma loucura. Costurava a pele com respiro e algodão. O suor escorria como banho. Teus olhos de pérola me davam sede. Saímos com marcas que as lembranças desejam. Já perdi a conta das camas, dos muros e da tentativa de ser feliz. Estamos em trânsito, em transe e transbordando de alguma coisa, buscando a distância do frigorífico, onde as carnes estão mortas e não existem trocas. Quero a poesia dos teus olhos e tua língua descrevendo exclamações e vírgulas. A gramática do corpo é marginal, cheia de doces atritos, alguns rios, erupções, riscos e outros acréscimos da escrita dos corpos. Um gole de reticências, enquanto lembro da maestria da poesia da tua dança e do teu canto indecifrável. Catamos nossa bagunça, sem a mão...
Orgulho de ser Caririaçuense
Literatura

Orgulho de ser Caririaçuense

Cícero José Oliveira Neves* Peço licença a vocêsNesse momento fielPara escrever es versosEm forma de um cordel Em forma de um cordelPorque é maravilhosoFalar de CaririaçuMe deixa muito orgulhoso A vocês que são leitoresQuero dar meus parabénsPois a cidade aniversariaO povo dela também Estes versos que eu faloÉ para homenagearUma linda cidadeNo interior do Ceará O clima dela é gostosoAs atrações são legaisNo dia 18 de agostoEla faz aniversário Por causa do clima bomMuitos vêm para cáE com essa finalidadeJá não querem mais voltar Foram os índios caririsOs primeiros habitantesDessa terra acolhedoraQue recebeu os imigrantes É feliz quem nela moraE todos que ela pertenceO motivo que me orgulhaDe ser Caririaçuense Para nossa cidade vemMuita gente visitarE dita pelos tu...
Vai, mulheres! Ser cuidadora na vida
Literatura

Vai, mulheres! Ser cuidadora na vida

Quando o poeta mineiro, autor de Alguma Poesia, nasceu na década de 1930, ficou registrado no Poema de Sete Faces: “Quando Nasci, um anjo torto/desses que vivem na sombra/ disse: Vai, Carlos! Ser gauche na vida”. Ao longo da História, à medida que nasciam, penso que esse mesmo anjo torto (ou um amigo dele, eu não sei), disse: Vai, mulheres! Ser cuidadora na vida. Não satisfeito, o anjo torto, na tentativa de conceber mulheres “perfeitas”, ainda sentenciou: 1) Ficarás restrita ao ambiente doméstico; 2) Não frequentarás os bancos escolares; 3) Serás uma criatura frágil que terá no sexo oposto o seu protetor; 4) Casarás como forma de inserção social; 5) Gerarás filho para manter sua descendência; 6) Cuidarás de tudo e de todos: marido, filhos (filhos dos filhos), parentes, etc. “Quan...