Por Alexandre Lucas*
A estátua de Nossa Senhora de Fátima perseguia o seu olhar e o desejo de matar consumia os seus caminhos. Era segunda-feira, já se tinha passado metade do ano e, naquele dia, a sua madrugada foi fábrica de ódio e alucinações. Tomou um dedo de café e mastigou perversidade. Acendeu seu cigarro, tragou apressadamente como se quisesse encher os pulmões de coragem. Fumou cinco cigarros, um seguido do outro. Cuspiu no chão, esfregou o cuspe com seu sapato empoeirado, como quem quer tirar manchas do chão.
Saiu, se benzeu e levou nossa senhora no olhar. Carregava por debaixo da calça uma falsa verdade de escritura da propriedade alheia e um revólver para demarcar os seus devaneios.
Matou sem balas os caminhos. Fez a barriga tremer. Todas as noites, durante anos foi esse pesadelo, sem um dia de trégua. O tempo passou, mas os monstros continuam vivos, rodando as lembranças. As vítimas do Araguaia não conseguem enterrar os seus algozes.
Quantos algozes ainda temos nas nossas cabeças?
Aquele monstro brincar com a criança, reza junto à nossa senhora, vai a procissão e, antes de dormir, faz o sinal da santa cruz e acorda para investir na morte.
*Escrevedor