Shirley Pinheiro
As ruas vazias apressam meus passos. O caminho de volta é sempre muito escuro. E o silêncio que desliza pelo asfalto, derrete as solas dos meus sapatos.
Hoje faz frio. Embora a chuva tenha cessado, o vento ainda respinga gotículas em meu rosto, como lágrimas que encontraram seu destino. Queria poder pular nas poças que se formam à beira da calçada, mas tenho um livro novinho na mochila que não ouso molhar. Aquelas páginas, ainda não lidas, exigem prudência. Então termino meu trajeto sem muitas extravagâncias.
A chegada é sempre um alívio. Não que haja muita presteza ao fim da jornada. Geralmente é quando o peso do mundo torna aos meus ombros. Mas é também quando a casa, que não é lar, torna-se fortaleza. Ao subir as escadas, a solidão recua e os cômodos iluminados ensaiam um conforto desastroso.
No mais tardar da noite, as luzes da janela da casa à frente testemunham minha angústia, a ansiedade comendo meus braços. Da última vez que estive aqui, as conversas demoraram a cessar. Hoje elas se acumulam, saudosas e incompreensíveis, adiadas até o esquecimento.
E não é esse o destino de todos nós?
Mas já era tarde da noite e eu nem percebi a vitória do breu.
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Shirley Pinheiro
*Graduada em Letras pela Universidade Regional do Cariri.