Ludimilla Barreira*
Ontem foi meu aniversário, e a única pessoa que me ligou para deixar claro, através do seu tom de voz, o quanto me ama foi a minha tia-avó. No mesmo instante em que retomo este pensamento, me vem à mente a imagem dos meus pais, que ainda estão vivos e com saúde, além de irmãos e outras tantas pessoas ao meu redor que me conhecem, no mínimo, há 40 anos. Mesmo não encontrando comigo no dia mais importante do ano (pelo menos para mim), acharam suficiente enviar uma mensagem de texto ou áudio para externar suas felicitações. Da mesma forma, fizeram a “Renner” e o “O Boticário”, mas eles ainda me ofereceram cupons de desconto.
Eu não tenho a menor pretensão de fingir que não seja doloroso ocupar esse espaço. Mesmo sabendo que existem tantos outros em que eu me encaixo com perfeição, é inegável que a pasta do esquecimento ou, sendo mais leve, da pouca importância é espinhosa e fétida. Nascemos esperando aceitação/acolhimento; amor é apenas construção dentro dessa relação em que apenas recebemos o outro.
Mas, aos 42 anos — minha nova idade —, eu não questiono o valor que eu tenho, isso eu sei bem. Porém, penso na vida que desperdiço cada vez que dou importância a quem não despendeu energia para digitar nove números e apertar o botão de discar. Além disso, seriam apenas mais uns três minutos falando palavras amáveis, e, em troca, receberiam um caloroso agradecimento.
Quando nos perdemos? Quando esse elo foi rompido? Ele existiu, ou o que nos une é apenas a conveniência das relações antigas e estáveis? Tudo isso ressoa em um emaranhado de pensamentos. Claro que essa não foi a primeira vez que me senti a indesejada ou a pessoa descartável. Esses sentimentos permearam inúmeros momentos da minha vida; por isso, às vezes nem sei onde consegui o discernimento de conceber a ideia do incrível valor que há dentro de mim.
É triste. Lamentável. Sofri ontem, sofrerei hoje, mas amanhã, talvez, tudo seja uma vaga lembrança desse momento. Eu gostaria de dizer que não gosto do meu aniversário, mas eu adoro esse dia. Acho fantástico comemorar um marco. Mais um ano significa mais vida, conhecimento e novas experiências. Na verdade, é uma grande dádiva viver mais e mais.
Mas há algo pior do que não receber uma mísera ligação. Por exemplo, você pode escutar uma desculpa para tentar remediar o que aconteceu, mesmo não sendo a primeira vez. Pois coleciono esses diálogos.
Lembro das inúmeras vezes em que me chamaram de boa menina, a compreensiva. E, por isso, eu odeio a palavra “compreensão”. Ser compreensiva não me levou longe. Talvez seja exatamente o motivo de precisar sangrar em um tanque de tubarões; talvez assim eu consiga, pelo menos, uma repreensão.
Não suporto que acreditem que sou o tipo de pessoa complacente, que nunca vai se chatear, que não vai espernear e mostrar aos outros como exige ser tratada. Mas, cansada, aceito, renego meus desejos por um bem maior e deixo que os outros tenham as suas vontades respeitadas. Afinal, esse salto do personagem só se desenvolve bem na ficção. Na realidade, se torna uma tarefa hercúlea.
Será que valeu a pena ser compreensiva?
Sobre a autora:
Ludimilla Barreira
*Leitora, sonhadora, eterna estudante e observadora da vida. Além disso, é bacharel em Direito, especialista em Direito Público, servidora do executivo estadual e defensora da igualdade.