No Escuro, SOU TÃO INSEGURA

Shirley Pinheiro

Eu amo quando me encontro nos versos de uma música.

É quinta-feira de novo, parece até que as minhas palavras só encontram seus caminhos depois desse pôr-do-sol. Mas, com a devida apropriação da liberdade poética, consideremos que o universo conspira a favor do meu encontro com a poesia, no dia mais cansativo da minha rotina, pra me lembrar que algo ainda vale a pena.

Nesta quinta, especificamente, No Escuro, Quem É Você?

Faz exatamente 38 minutos que terminei de escutar o álbum recém-lançado de Carol Biazin e encontro-me estatelada no chão do meu quarto, rodeada de gatos, a dois minutos da meia noite, sentindo o que não deveria: uma vontade danada de dançar desgovernadamente no escuro, mesmo tendo que acordar nas próximas cinco horas para ir trabalhar e mesmo sem nem sequer saber dançar. Mas, como diz uma das personagens da minha série favorita, “Todo mundo sabe dançar, Joana. É só você deixar seu corpo fazer o que ele tá pedindo, conforme a música”. Mas como eu ainda nem me recuperei da dor nas costas, vou descartar essa opção (acho que a Alice entenderia).

Ao invés disso, vim tentar traduzir meu encantamento.

Quem já conversou minimamente comigo, já me ouviu falar com muita paixão sobre música (ou pelo menos citar alguma, aleatoriamente, numa conversa, porque, infelizmente — ou não — eu sou esse tipo de pessoa). Eu costumo dizer que vivo de arte de uma forma, não econômica, mas vital. A poesia é o ar que eu respiro; a música é a água que mata minha sede e a literatura é o pão que alimenta meu espírito. Sendo assim, não é novidade me encontrarem por aí, eufórica por causa de uma música.

E esse é exatamente o termo que me define agora: eufórica. Quase até em êxtase, se me permitem usar a licença poética novamente.

Ano passado, quando Carol Biazin lançou a primeira parte de seu álbum — No Escuro, —, eu fui destruída, triturada e esmiuçada. Cada faixa conversava comigo de uma maneira sincera, romântica e melancólica. Os versos de Low Profile e Tr*sANte me traziam os olhos que não deveriam, enquanto (Não) Quero Me Apaixonar desenhava as minhas próprias mentiras. O que dizer, então, de Casula e Conversei Com Deus, que são absolutamente perfeitas? Mas foi quando a voz melódica de Carol Biazin cantou “Cuida do que nunca foi cuidado/ Pareço ser forte, mas sou frágil / Aceita meu amor traumatizado?/ […] Lá vou eu de novo, apostando tudo / Não decepcione, já não tenho muito / Pra perder de novo, sei que não é justo/ Te amar com medo, meu porto inseguro”, que me vi despida diante de uma música.

Agora, nove meses depois, No Escuro, Quem É Você? finalmente é do mundo. Finalmente é meu. E eu até poderia tentar encontrar palavras pra me descrever nesse momento (ouvindo o disco novamente), mas nem se tivesse o auxílio de Aurélio Buarque de Holanda, eu o faria.

A primeira vez que ouvi a faixa TE AMO SEM CULPA, eu chorei, aos montes, incontrolavelmente. AMAReSÓ ainda reverbera no meu pulsar. E novamente, Carol Biazin desenha minhas mentiras ao cantar Hoje eu só queria alguém pra confiar/ Pra poder desmanchar no peito/ Alguém que me faça desacelerar/ Sem ter que pôr o pé no freio”. Nesse momento, a música que toca nos meus fones é Códigos, que eu até repetiria, mas tô ansiosa pra ouvir Sou Tão Insegura, a música que me despiu de forma violenta e me deu as palavras necessárias para escrever esse texto. E, sinceramente, se essa música não foi escrita para mim, para quem mais ela serviria?

Falei demais só sobre você, sim, mas

Quase não lembrei de mim, então vou falar de mim

Ciumenta, aquelas quase nada possessiva

Estressada, verdadeira e meio explosiva

Sem tempo pra drama com carinha de metida

Mas também aquela que dá vida pra sua vida

Se me desvendar vai ver o quе não falei de mim

Que tal mе enxergar?

Sou tão insegura, sei que não parece

Pode ser loucura, mas tenho medo de ficar só

Deve ser carência, me diz qual a cura

Pra essa dependência, pr’esse medo de ficar só

Gosto de toque, até de mais

Me cobro demais por nada de mais

Odeio quando esfria

Em tardes cinzas, o meu dia tão paia

Sobre a autora:

* Formada em Letras. Graduanda em História pela Universidade Regional do Ca