Alexandre Lucas
O direito à literatura é parte integrante da luta pelos direitos humanos, essa é a premissa da defesa do Antonio Cândido no seu manifesto “O Direito à Literatura”, que reflete sobre literatura, a partir das contradições do modo de produção capitalista, em que a aponta o avanço da racionalidade técnica e de domínio sobre a natureza como algo positivo, mas ao mesmo tempo distante de atender as necessidades humanas. Cândido defende que a sobrevivência física e a integridade espiritual compõem a luta pelos direitos e a dignidade humana.
No sentido amplo, é indissociável nos separar das artes e das literaturas. A produção humana é carregada por símbolos que possibilitam a nossa comunicação, reflexão, entretenimento, ressignificação, instigamento criativo, descobertas, apropriação do conhecimento, associações, memórias, ampliação de repertórios, narrativas e alteração da visão social de mundo.
Logo, as artes e as literaturas são resultados da produção histórica e social da humanidade. Neste sentido, a escola, destinada a atender a classe trabalhadora, tem função social imprescindível: sistematizar, contextualizar, confrontar e socializar o conhecimento científico, filosófico, artístico, literário, cultural e estético da humanidade, vinculando a prática social dos indivíduos. Esse fator que parece ser óbvio, camufla uma realidade que exclui historicamente as camadas populares do acesso ao conhecimento e impõe vidas com direitos humanos negados. A sociedade dividida em classes sociais distintas e com interesses antagônicos é a mesma que mantém a desigualdade da acessibilidade e apropriação do conhecimento.
É neste contexto que os espaços de democratização das leituras, literaturas e dos livros no âmbito escolar devem ser percebidos como estratégicos para o desenvolvimento intelectual dos estudantes.
O acesso às leituras, às literaturas e aos livros contribuem para capacidade de ampliar a visão social de mundo das educandas e educadoras (educandos e educadores também). A apropriação quantitativa das palavras é fonte de redimensionamento de repertório e posicionamento político e social. A palavra é sempre acompanhada de contextos e conceitos sociais.
A diversidade e pluralidade literária devem ser constantemente ampliadas. A literatura “inofensiva”, aos olhos do estado, não deve ser excluída, mas complementada com outras abordagens. A literatura excluída dos livros que circulam normalmente nas escolas, mas que configura as paisagens culturais, territoriais, identitárias, populares e contestatórias do nosso povo devem circular na ambiência escolar. O popular e o erudito devem se conflitar dialeticamente para gerar novos conhecimentos. O saber popular deve ser ponto de partida para se chegar ao conhecimento erudito, visando tornar o erudito popular.
A acessibilidade da palavra conjugada com a prática social proporciona um olhar multidisciplinar, facilita e pode despertar para várias áreas do conhecimento e ao mesmo tempo contribui para fruição estética, descoberta, reflexão da produção humana e instigamento de processos criativos.
A palavra é um instrumento político. A partir dela é possível romper as barreiras da normatização opressora, quando coloca estudantes na condição se verem capazes de falar, refletir, posicionar e produzir textualmente. Essa dimensão corresponde a função social da escola e a garantia dos direitos humanos, enquanto integridade espiritual.
Por outro lado, devemos repensar e nos questionar qual a escola pública que queremos construir? A escola crítica e de promoção da cidadania? Será que essa narrativa de escola pública de caráter crítico e cidadã se sustenta? Se o conhecimento não é contextualizado com outros conhecimentos e a prática social e o direito de questionar é suprimido, será que estamos construindo a escola para emancipação humana?
Pedagogo e integrante do Coletivo Camaradas