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Escola cívico-militar: uma ameaça à democracia do conhecimento e da criticidade
Política

Escola cívico-militar: uma ameaça à democracia do conhecimento e da criticidade

Alexandre Lucas A escola militar, concebida ainda no período colonial brasileiro, consolidou-se em 1889 com a criação do Imperial Colégio Militar (atual Colégio Militar do Rio de Janeiro), no contexto da Proclamação da República. Questiona-se: em que contexto histórico e com quais objetivos essas escolas foram criadas? Esses questionamentos são fundamentais para compreender sua inadequação no cenário educacional contemporâneo. Durante o regime militar (1964-1985), instaurado por um golpe de Estado, predominou uma concepção pedagógica restritiva que transformou as escolas públicas em espaços de formação técnica para o mercado de trabalho - o chamado tecnicismo. Essa "pedagogia de ensinar apertar parafusos" destinava-se à classe trabalhadora, enquanto o acesso ao ensino superior perman...
Planos de Cultura para outra cultura política
Política

Planos de Cultura para outra cultura política

Alexandre Lucas O planejamento da política pública para a cultura, resultante dos fóruns, conferências e outros mecanismos de consulta que culminam nos Planos de Cultura previstos nos sistemas de cultura (municipal, estadual e federal), são prerrogativas políticas com dimensão jurídica. Esses planos podem servir como estratégia para redimensionar e colocar no campo da macropolítica a escala da acessibilidade da diversidade e pluralidade cultural para a classe trabalhadora. Os planos não são, necessariamente, instrumentos restritos a um setor de execução. Os Planos de Cultura devem ser percebidos como um leque de possibilidades para transitar na transversalidade e na intersetorialidade dos governos. A perspectiva de transversalidade da cultura não é uma questão nova, mas ganha ...
A foto do final de semana
Literatura

A foto do final de semana

Alexandre Lucas Hoje, exatamente neste instante, a mesma mesa, os pássaros — acho que são os mesmos —, a paisagem, a mesma. O calor tomando conta, o almoço já está pronto, mas perdi a fome num estalo. Queria ler por algumas horas a poesia da menina de cabelos cacheados, que deve escrever como a sua neurodivergência: cheia de intervalos e com escritas invisíveis. Talvez fosse a dopamina da tarde, o vinho para desequilibrar as certezas. Converso com a enfermeira, que fala de feridas de difícil cicatrização. Lembrei-me de Eduardo Galeano: As Veias Abertas da América Latina. Manu manda uma mensagem avisando sobre a tia doente e justificando os porquês de ainda não ter vindo deixar os livros. Ela vai viajar, trabalhar onde são discutidos os rumos do país. Guardo dela alguns sorris...
Armamento para o pensamento crítico
Literatura

Armamento para o pensamento crítico

Alexandre Lucas É indiscutível que a palavra escrita é essencial para o desenvolvimento cognitivo, a associação de ideias, a ampliação da memória e da argumentação. A palavra, enquanto produção histórica e social, reflete demarcadores societários e, hegemonicamente, reproduz ideologicamente as ideias das elites dominantes. A escola tem uma função primordial na apropriação e no uso multifacetado da palavra, mas, ao mesmo tempo, pode ser limitante ao se focar apenas no uso da norma culta, desconsiderando a dimensão da linguagem como vetor de tecer o social. Na escola pública, a palavra deve assumir um lugar contra-hegemônico, ou seja, representar a apropriação da “técnica e das regras” da norma culta associada à prática social dos indivíduos e à contextualização sócio-histórica....
Ponto de Cultura é processo e não produto
Cultura

Ponto de Cultura é processo e não produto

Alexandre Lucas A ideia de que o Ponto de Cultura é a afirmação da trajetória e da permanência da continuidade tem como referência o fato de que não se trata de produzir um novo produto para ofertar ao Estado, uma lógica semelhante à do mercado. Pelo contrário, o Estado deve garantir que experiências de base comunitária e territorial consigam se afirmar econômica e politicamente, colocando o processo como parte fundamental de um Ponto de Cultura. Essa é a concepção basilar e de ruptura com as políticas culturais dominantes, que deram origem ao Cultura Viva no país. Essa perspectiva confronta-se com a retomada da Política Nacional de Cultura Viva, que vem se configurando por um viés notadamente marcado pelo mercado e que precisa ser combatido. Essa constatação pode ser percebida desde...
Lutador da felicidade
Literatura

Lutador da felicidade

Alexandre Lucas*  A ambiguidade da expressão "luto" demarca os contrários entre o convencimento da morte e a resistência para sobreviver. Lutamos todos os dias porque algo está sempre se transformando; a materialidade ou o sentimento nunca são estáveis. Uma dor presente ou do passado sempre nos deixa em luto, mas, por outro lado, viver é sempre uma estação de luta. Nos primeiros sete anos de vida, lutamos para aprender a andar, falar, coordenar os movimentos das mãos e até nos limpar quando vamos ao banheiro. Já imaginou que passamos quase sete anos para aprender isso? Nada é dado; tudo é luta. Mas a luta é um processo que se dá das mais diversas formas: para alguns, têm cara de luto; para outros, a pancada é menor. Ambos, no entanto, são desafiadores. Há dias só de luta, mas...
Sambocracia: um samba que ensina o Crato
Literatura

Sambocracia: um samba que ensina o Crato

Alexandre Lucas* O samba tem seu nascedouro nos corpos e identidades dos povos escravizados no Brasil, consolidando-se como um gênero musical que reflete o cotidiano, a resistência e a alegria da classe trabalhadora. A música de boteco, do morro, da beira da rua, do salão e da passarela vai além da diversão e insere-se na dimensão da democratização estética e artística, essencial para ampliar a visão social de mundo e reposicionar o olhar político.   No Crato, o Coletivo Sambocracia, criado em 2018, desempenha um papel político ao promover o samba alinhado à defesa da democracia.   Qual a relevância política do Sambocracia para pensar as políticas públicas para a cultura? Podemos destacar alguns pontos relevantes, como: o aquecimento da Economia da Cultura e de...
O capitalismo distancia nossos abraços
Literatura

O capitalismo distancia nossos abraços

Alexandre Lucas* Escrevo poesia com a faca na língua. Óculos sujos e letras embaraçadas. A borboleta pousa na nas bananas e o carnaval sacode as minhas dores.  Larissa fala de poesia e de ternura quando me ler, mas está distante, o capitalismo distancia nossos abraços. Tenho andado só e descoberto que as ruas estão desertas e que os corações estão cheios de marcas e assaltos, alguns tiros. Outro dia recebi uma foto da praia: ela estava cheia de sol, enquanto recebia o calor do café numa manhã de sábado, num boteco regado de conversas sobre solidão e arte. A praia estava distante e o celular me atormentava com imagens mentirosas de felicidade. A médica estava melhor, estava quase podendo dançar e cuidar dos animais. Morava só, aliás com os seus cachorros. Faz tempo que a ge...
Pontos de Cultura como motor de desenvolvimento para o Crato
Cultura, Política

Pontos de Cultura como motor de desenvolvimento para o Crato

Alexandre Lucas* Para colocar a cultura no centro do desenvolvimento do Crato, a nova gestão municipal precisa ir além da boa vontade política. Exige ações concretas, investimentos estratégicos e uma mudança de paradigma que reconheça a cultura como pilar fundamental da cidade. A Lei Municipal nº 3.799/2021, que institui a Política Municipal de Cultura Viva do Crato, representa um marco fundamental para o reconhecimento e o fortalecimento da cultura de base comunitária na cidade. Os Pontos de Cultura têm   importância crucial para o desenvolvimento social, econômico e cultural do município. Os Pontos de Cultura, entidades e coletivos culturais que desenvolvem e articulam atividades socioculturais em suas comunidades, são muito mais do que meros espaços de produção e ...
Tempos para fazer bolos
Literatura

Tempos para fazer bolos

Alexandre Lucas* Saudade de bolo de cenoura com cobertura de chocolate, isso pode ser um código anunciado meio dia e meio, ou a qualquer momento em que a ausência bate na porta para derrubar. Três dedos de vinho e uma preguiça imensa de ir comprar outra garrafa, a saudade pede vinho. Se possível trocaria a garrafa de vinho por esquecimentos seletivos, deixaria na memória apenas aquilo que não doesse. Mas não quero bolo de cenoura com cobertura de chocolate que me faz mal. Poderia tomar uma garrafa de amnésia para sustentar a realidade, mas elas não existem.  As folhas dançam, nem sempre podem ir com vento. Os bolos acabam. Ainda não acabei o vinho. Os planos para o dia seguinte estão amassados no bolso junto com molho de chaves que não encontram fechaduras. Mas amanhã é se...