Renato Mendes
New the Walking Dead?
Surfando na onda de séries pós apocalípticas, que ganharam ainda mais força no cenário pandêmico, a HBO acertou na produção de The Last Of Us. No entanto, a série é bem difícil de ser comparada a outras do gênero. The Walking Dead, por exemplo, é semelhante por também ter uma versão como jogo, só que é menos conceitual, os infectados têm mais protagonismo e são mais violentos. A morte de Tess (Merle Dandridge) é um bom exemplo, quando encurralada pelos “zumbis”, eles não a mordem todos de uma vez, como aconteceria no produto da AMC, mas apenas um infectado deixa os esporos entrar pacificamente pela boca dela. Grosseiramente, há pouquíssimas semelhanças entre as duas produções.
Fazendo o comparativo entre as duas, um elogio a HBO foi mostrar a origem da infecção logo no começo. Enquanto o AMC já produziu 11 temporadas sem esclarecer o caos instalado no planeta.
Atuação de gala
The Last Of Us é uma adaptação de um jogo homônimo, nela um fungo sofre uma mutação e passa a ter capacidade de controlar o cérebro dos humanos. Esse parasita se espalha pelo consumo de produtos à base de trigo. Elie, interpretada por Bella Ramsey, chega para o nono episódio depois de enfrentar e matar um líder religioso, que tenta cortá-la para alimentar sua comunidade. A garota demonstra estar completamente abalada por tudo que aconteceu. Ela ainda sofreu várias perdas ao longo da trama. Tess (Merle Dandridge), Sam Burrell (Keivon Woodard) e, principalmente, a melhor amiga Riley (Storm Reid), ficaram pelo caminho arrasando a personagem e exigindo uma carga de atuação mais dramática de Bella. E é nesse episódio que ela se mostra como uma grande atriz. Não sendo nenhuma surpresa, pois apesar de jovem, a atriz fez belos trabalhos, incluindo participações em outras séries. O jornal The New York Times, por exemplo, a colocou como “grande destaque da sexta temporada” de Game of Thrones.
Pedro Pascal, o Joel na série, também faz uma grande atuação, mas ao contrário da parceira tem um currículo invejado em Hollywood. E já teve a experiência de protagonizar o título mais popular da Disney, The Mandalorian. Esse capítulo é fundamental para entender melhor o seu personagem. Joel depois da morte da filha, Sarah (Nico Parker), tinha como combustível para viver a busca pelo irmão, Tommy (Gabriel Luna), no entanto seu emocionante reencontro com o irmão não atendeu às suas expectativas. O final do enredo coloca, mais do que nunca, Joel como pai de Ellie. Ele é peça fundamental para levantar o astral da garota e expõe totalmente sua falta de escrúpulos para defendê-la. No começo da história, ele é ainda um espécie de super homem, forte e indestrutível, só que na reta final da busca pelos vagalumes acaba admitindo que atentou contra sua própria vida. Tal cena engrandece seu personagem, e expõe a proximidade familiar com Ellie.
A crítica tem uma tendência a comparar o jogo com o seriado. Isso é inevitável nesse tipo de adaptação. Em tal quesito os produtores foram astutos conservando a essência do jogo e adicionando pontos chaves.
O início do fim
As primeiras cenas são simplesmente impecáveis e elas não fazem parte do roteiro do game. Primeiro começa com Anne, ainda com Ellie na barriga, fugindo de um contaminado. E é admirável ver as semelhanças gestuais da atriz Ashley Johnson com a heroína Ellie. Os telespectadores que são games matam logo a charada de que ela interpreta no jogo justamente a estrela principal. Chama a atenção também, a similaridade física. Sem nenhuma dúvida, Ashley foi uma escolha perfeita para o papel.
Na cena seguinte, Anne entra, prestes a dar à luz, em uma casa vazia. No exato momento do nascimento, o monstro a ataca. E os fãs percebem o motivo da imunidade de Ellie. Sua mãe mata o Cordyceps com o mesmo canivete que corta o cordão umbilical.
O enredo do episódio foi brilhantemente amarrado para causar emoção. A bebê é entregue logo no começo para Marlene (Merle Dandridge). E no final ela diz para Joel: “Eu tava lá eu prometi a mãe dela que cuidaria dela”.
Momentos pai e filha
Após a tensão inicial, começa uma caminhada entediante até o laboratório. A cidade está completamente destruída e o enquadramento favorece a percepção da destruição. Parte do cenário está coberto de folhas, tal como no jogo. Ellie não demonstra nenhum interesse em conversar com Joel, até que o aparecimento de uma girafa quebra o clima de tristeza da garota.
Após o encontro inusitado, eles começam a conversar descontraidamente. E se quem assiste já tinha começado a ficar com sono, o relato de Joel sobre a origem da marca no rosto chama a atenção. Depois Ellie começa a ler o seu livro de piadas ruins. De forma bastante apelativa, mas necessária, o momento leve é quebrado abruptamente com uma granada para espantar a melosidade.
De todas as maneiras possíveis de entrar no laboratório, eles serem sequestrados foi o mais absurdo possível. Acordando numa cama, Joel encontra Marlene, a qual explica a necessidade de fazer uma cirurgia para extrair uma possível cura para a humanidade.
Fim surpreendente
As cenas anteriores no enredo humanizam Joel, fazendo compreensível sua decisão de não aceitar fazer o procedimento. Depois de tudo ele não poderia nem pensar em perder a nova filha. Só que no contexto era tudo ou nada para ele, então
foi obrigado a matar quem o impedisse de tirar Ellie do hospital. Logo a série, e o episódio em específico, que tinham poucas cenas de ação, até aquele momento, dar lugar a uma sequência de tiros a queima roupa. Por um momento a série ficou idêntica ao game, pessoas sendo assassinadas por Joel. Simplesmente tiro ao alvo, embalado pela trilha sonora dramática, sem nenhuma dificuldade para o grande herói. O foco da obra não é a troca de tiros, talvez por isso uma cena tão pobre.
O valente protetor, antes adoçado, deu lugar a um matador frio. E essa visão negativa é ainda mais reforçada quando ele mente olhando nos olhos de Ellie. E ainda mata Marlene desarmada com dois tiros. A parte final coloca no início uma expectativa que Marlene encontraria Ellie, só que tal coisa não ocorre.