Ludimilla Barreira*
Querida Frustração,
Escrevo para saber por onde você anda. Nunca mais te encontrei. Nosso último momento juntas passou rápido, nem atravessamos uma noite em claro. Achei que você me visitaria esses dias, mas creio que esteja deveras ocupada sendo inquilina de outra pessoa.
Você não vai acreditar! Percebi-me sonhando com o que um dia me disseram ser impraticável. Fui muito feliz por alguns dias; ao fechar os olhos, imaginava que tudo havia se concretizado. Vi meu reflexo naquele rascunho de futuro. Lembra que nunca fui encorajada a sonhar alto? Sempre ouvi que é melhor querer pouco e ficar satisfeito do que querer muito e ser infeliz. Mas senti uma felicidade genuína em sonhar. Preciso estar atenta e gravar essa sensação. Você sabe como é? É ótima!
Foi o Medo que me deixou mal-acostumada, dizendo que era melhor nem sonhar. Por vezes, ao menor sinal de dificuldade, chancelei algumas impossibilidades e deletei opções que, talvez, fossem difíceis, mas jamais impossíveis. Resolvi ser um pouco teimosa. Em virtude dessa reflexão, percebi que nada me custava tentar; inclusive, poderia criar altíssimas expectativas, daquele tipo quando a gente sonha acordado.
Já passamos longos períodos juntas; achei que seríamos inseparáveis. Ao longo da minha história, as diferentes etapas pelas quais passei e que me constituíram reforçaram a ideia de que sempre é mais fácil não mirar em algo com o profundo desejo de possuir ou realizar. Condicionei-me a não crer, enquanto, na verdade, espero que a maturidade me ensine a aceitar melhor as circunstâncias que invariavelmente não sairão da forma que espero. Diga-me, onde há crescimento em viver sem criar expectativas?
Assim, apenas o Sofrimento vai crescer e tomar todo o espaço disponível. Se eu exercitar meu sonho, posso esperar pela sua breve visita. Pode vir, mas não traga a sua mala para longas viagens. Aprenderei com você por um tempo, mas nossos encontros serão breves. Quanto a mim, não há nada para você se preocupar. Eu soube sonhar. Sorrir. Imaginar. Fingi até que já era verdade. Mas não foi. Chorei (não tenho culpa em ser emocionada). Quando percebi que não seguiram o roteiro que eu criei, parei por alguns segundos e pensei que talvez não fosse o momento adequado. A vida tem disso. Muitas vezes acreditamos que estamos prontos e ela nos dá uma lição, mostrando que a paciência é a melhor marca de travesseiro para descansar. Arrependi-me de não ter criado mais sonhos em todos os momentos. Sonhar é bom, mesmo que digam o contrário. Sabia? Ter a cabeça cheia de planos é como tomar algo quentinho no frio. É como ter um lugar calmo para onde ir depois de um dia cheio e barulhento. Afaga a alma e o coração. Afinal, quase tudo dá para resolver com um banho demorado, pijama limpo e um chá quentinho; só não damos jeito em doenças muito sérias.
Um grande abraço.
P.S. Espero te ver apenas quando for comprar sorvete e não encontrar meu sabor preferido.
Sobre a autora:
Ludimilla Barreira
*Leitora, sonhadora, eterna estudante e observadora da vida. Além disso, é bacharel em Direito, especialista em Direito Público, servidora do executivo estadual e defensora da igualdade.